sexta-feira, 5 de outubro de 2012

A ESCOLA E O SONHO DE SE TORNAR JOGADOR DE FUTEBOL



Historicamente a escola vem servindo como instrumento e meio de repercussão e legitimação política e econômica em nosso País. Neste contexto, o desenvolvimento e evolução da Educação no Brasil apresentam uma cronologia caracterizada pela elitização de suas instituições e do ensino em seus anos primais, passando por um período de abertura dos “muros escolares” à população em geral, e culminando atualmente com um processo de democratização educacional que não só promove o acesso de todos à educação, independentemente de classe social, raça, credo, etc., como ainda, garante por lei, o referido acesso, a permanência e a evolução nos anos escolares.
Quando a escola permite-se democraticamente receber a sociedade, ela passa a atrair e conviver com todas as nuances, conflitos, desafios e aspectos que caracterizam e definem esta sociedade.
Se atualmente a escola assume, mesmo que ineficazmente, um papel educacional global, que a leva ao tratamento não só das questões pedagógicas que se lhe apresentam, mas também, ao trabalho obrigatório dos aspectos psicológicos, sociais, de segurança e desestruturação familiar, é por que em última análise, o processo de democratização escolar se relaciona, influencia e é influenciado pela imensa variedade de fatores que definem uma sociedade. Ao mesmo tempo, é clara e efetiva a intenção governamental em transformar a educação e a escola em legítimos “salvadores da pátria”, para que se tenha assim, uma excelente plataforma política.
A Educação Física escolar, assim como a própria instituição escola, historicamente acompanha e representa os aspectos políticos e econômicos vigentes. Com o passar das décadas, ela já assumiu diversas vertentes – eugenia de raça, higienista, militarista e tecnicista – esta última, caracterizada pela esportivização escolar, se deu no período de transição entre os modelos políticos militar e democrático, o que contribuiu para a sua expansão, não obstante seu caráter seletivo e excludente.
Atualmente, como produto de um processo contínuo de evolução e reflexão, a educação física trabalha com uma proposta diferenciada, atentando aos conteúdos voltados ao jogo, ginásticas, danças e atividades físicas, lutas, corpo e movimento, incluindo o próprio esporte. Contudo, o caráter competitivo deixa de prevalecer no esporte escolar (dentro da grade de educação física), o mesmo acontecendo com sua exclusividade.
Entretanto, o anseio e identificação com o esporte escolar, como ferramenta fundamental para a conquista de uma carreira vitoriosa e de sucesso, de forma a proporcionar uma ascensão social (população carente), se faz presente de forma intensa e constante no imaginário de jovens, e também nos discursos de políticos, empresários e da população em geral, haja vista o apelo e a referência que se faz à escola, quando o assunto é investir em esporte e em crianças, a fim de se promover a formação de atletas, sobretudo em épocas de olimpíadas e copa do mundo.
O professor de educação física convive diariamente com estas questões e com os anseios de jovens que sonham em se tornar atletas (sobretudo de futebol) como forma de melhorarem as condições em que vivem, principalmente fazendo o que mais gostam.
Esses sonhos são estimulados por uma mídia que se ocupa em divulgar apenas informações positivas a respeito do esporte – contratos milionários, patrocinadores, belos carros, casas, mulheres, times do exterior - que acabam por gerar uma falsa percepção da realidade esportiva nacional.
Apenas uma pequena porcentagem dos que intentam se tornar jogadores de futebol obtém êxito, e mesmo quando o objetivo é alcançado, uma minoria destes recebem salários milionários. A grande maioria dos jogadores profissionais recebem salários modestos, muito abaixo do imaginado, tendo em muitos casos que arcar com os custos de condução, alimentação e equipamento esportivo.
Porém, na escola, onde este objetivo ainda é um sonho, os jovens desconhecem ou desconsideram todos os aspectos envolvidos no processo para a formação de um atleta profissional, tais como a necessidade de agentes, oportunidades, “peneiras seletivas”, entre outros. Percebemos que o enorme desejo em se tornar jogador de futebol não se converte em ações e estratégias efetivas para a conquista do objetivo almejado. Tão pouco a escola, e a educação física escolar, estão estruturados de forma a promover tal empreitada.
Com isso e com o passar dos anos, sem que atitudes efetivas tenham sido tomadas, e sem que se tenham atentado paralelamente a um “Plano B” – estudo – jovens de dezesseis, dezessete e dezoito anos descobrem-se velhos para o futebol e nesse instante a escola deixa de ter um significado para eles.
Sem formação educacional e objetivos, porém ainda com o desejo de ascender socialmente, estes jovens acabam sucumbindo ao chamado do crime, presente no cotidiano de vida de populações carentes, que o acolhe e o serve prontamente, com os benefícios que outrora eram expectativamente vinculados a carreira futebolística.
Qual a responsabilidade da “Instituição Futebol” – em todos os seus segmentos e setores – neste contexto? A escola e a educação física devem arcar com a responsabilidade de formação de futuros atletas profissionais? Qual a significação escolar atual para a sociedade? Como criar novos significados da escola para atender aos anseios de seu público, a fim de resgatar o respeito e a valorização educacional e diminuir o abandono escolar?
Estas são questões que requerem reflexões e respostas urgentes sob a pena de que ao ignorá-las, estejamos acentuando os problemas e conflitos sociais e educacionais dos quais somos vitimas, porém, também responsáveis.


Alessandro Morelli.

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